Raul Seixas - Um visionário do rock na busca do "ouro de tolo"
Raul Seixas foi um artista icônico que marcou época, mas terminou sua vida como mais um "mártir" do rock. Não que o rock tenha algum mal em si ou seja coisa do diabo. Mas o estereótipo cultural do chamado sexo, drogas e rocknroll tem feito estrago no mundo há algum tempo e deixado alguns mártires pelo caminho. Artistas que acreditaram no falso brilhante dessas ideias e pagaram com a morte prematura pela sua ousadia.
Esse tipo de consequência faz refletir sobre o fim da vida do homem entregue a si mesmo, aos seus próprios desejos. Mas quem são os mártires do rock? São aqueles que viveram, no limite, a máxima sexo,drogas e rocknroll e pagaram um preço alto com mortes prematuras, alguns antes mesmo de alcançar a maturidade dos 30 anos. Como um inocente Ícaro, voaram inconsequente para perto demais do sol.
Essa cultura da autodestruição fomentada por muitos ídolos do rock ganhou corpo a partir do período áureo da chamada contracultura, a partir dos anos 50. Alguns podem dizer: mas isso está fora de moda, não acontece mais assim. Os fatos atuais insistem a desmentir quem defende a tese de coisa do passado. Essa ousadia artística ganha outros ares, mas sempre navega pelo além do limite, atravessando fronteiras.
Mas é interessante aprofundar a análise sobre as consequências da chamada "vida loka" verificando a raiz desse tipo de comportamento. Essa gênese pode estar atrelada no choque cultural difundido pelo humanismo secular e por outras vertentes do racionalismo na sociedade que busca romper com o tradicionalismo muito associado à cosmovisão cristão do mundo. Mas vamos mais fundo a seguir:
Humanismo secular e os mártires do rock
Os humanistas seculares confiam mais na inteligência humana do que na orientação divina e desprezam seus princípios. Os adeptos dessa postura filosófica rejeitam a fé e construíram um arsenal de argumentos para enfatizar a beleza da natureza humana e a felicidade possível a partir do livre pensamento. São pais dos ateus e agnósticos que se multiplicam nos dias de hoje.
Trazem um discurso carregado de razão e sensibilidade. Um dos pilares dessa filosofia é a "busca da satisfação, do desenvolvimento e da criatividade, para o indivíduo e para a humanidade em geral". Segundo a Declaração Humanista Secular, emitida em 1980:
"Humanistas seculares podem ser agnósticos, ateístas, racionalistas ou céticos, mas eles consideram as evidências insuficientes na afirmação de que existe um propósito divino para o universo. Eles rejeitam a ideia de que deus (grifo meu!!) tenha intervindo, miraculosamente, na história ou se revelado a uns poucos escolhidos ou que ele possa salvar ou redimir os pecadores. Eles acreditam que os homens e mulheres são livres e são responsáveis por seu próprio destino e que não podem olhar em direção a um ser transcendental para salvação. Nós rejeitamos a divindade de Jesus, a missão divina de Moisés, Maomé e outros profetas e santos do dia das várias seitas e denominações".
Mas o que tem a ver os humanistas com os mártires do rock? Alguns desses artistas foram a representação hiperbólica desses princípios filosóficos, amparados na liberdade total e na busca do prazer e satisfação pessoal, confiando na natureza humana e em todo seu potencial. Como artistas e ídolos pop, ajudaram a espalhar muitos desses princípios que hoje fazem a cabeça de parte da juventude sem referencial familiar sólido e consistente.
Outro conceito presente entre os humanistas é que devemos aproveitar ao máximo a única vida que temos. Assim eles vivem o aqui e o agora, sendo responsáveis pela busca de significado e um propósito para suas vidas. Esse humanistas têm um lema: os seres humanos são responsáveis por seu próprio destino. E qual é o destino das pessoas entregues a si mesmas? Entregues aos seus próprios desejos e paixões? A Bíblia fala muito sobre essas consequências.
Martírio no rock - o caso Raul Seixas
A história de alguns desses ícones do rock revela diversas dessas consequências. No caso do Brasil, ilustro com a história de vida do rei do rock tupiniquim, o Raul Seixas. O exemplo dele é bem hiperbólico, porque além de ultra humanista, Raul carregava uma mística e um objetivo: popularizar sua ideologia libertina, com lastro filosófico.
Para isso, buscou múltiplos caminhos, desde a iniciação em sociedades secretas, experiências alucinógenas e muita informação de pensadores e filósofos humanistas. O ápice foi o envolvimento com o ocultismo e o mergulho de cabeça nas ideias de Aleister Crowley.
A influência de Crowley no pensamento contemporâneo extrapola o exotismo. A criação da cientologia é um dos ramos de toda sua teoria. Raul Seixas foi um discípulo ativo de Aleister. Sua sociedade alternativa nada mais era do que uma síntese popularesca da Lei de Thelema de Crowley. "Faça o que tu queres pois é tudo da lei...". Crowley foi fundador da OTO (Ordo Templi Orientis) uma seita que invocava a liberdade total do homem sem os limites morais da tradição cristã. Seu fundamento está na obra de Crowley denominada "O Livro da Lei".
Uma das bases do pensamento de Crowley: "o amor (livre) é a lei e todo homem e todo mulher é uma estrela". Todo o ensinamento converge para o homem como uma entidade livre, única e dominante de todo o cosmos. O homem como seu próprio "deus". Muitas são as referências dos ensinos de Aleister nas músicas do Raul. Princípios que casam com o conflito de Lúcifer, relatado na Bíblia e causador da chamada queda do homem, também conhecido como pecado original.
A OTO é organização social ainda ativa com representação e atuação no Brasil, conforme pode ser confirmado em seu site. Segundo a própria organização, a Lei de Thelema foi estabelecida nos dias 8 a 10 de abril de 1904 quando “Aleister” Crowley recebeu da entidade conhecida como Aiwass, chamado de Ministro de Hoor-par-kraat, o Liber AL vel Legis, o Livro da Lei. Este livro, segundo os integrantes da OTO, traz uma mensagem espiritual que define a ética e os objetivos da humanidade para o chamado Aeon (Era) de Hórus, e se baseia nas duas premissas, chamadas de Lei de Thelema: Faze o que tu queres será o todo da Lei. Amor é a lei, amor sob vontade.
As músicas de Raul Seixas são carregadas de simbolismo dessa imersão no ocultismo e também no humanismo. Do homem/deus que carrega todas as verdades dentro de si e é livre para seguir o seu coração.
Sociedade Alternativa
Viva! Viva!
Viva a sociedade alternativa
Viva! Viva!
Viva a sociedade alternativa
(O número 666
Chama-se Aleister Crowley)
Viva! Viva!
Viva! A sociedade alternativa
(Faz o que tu queres
Há de ser tudo da lei)
Viva! Viva!
Viva! A sociedade alternativa
(A lei de Thelema)
Viva! Viva!
Viva a sociedade alternativa
(A lei do forte
Essa é a nossa lei e a alegria do mundo)
Viva! Viva!
Viva a sociedade alternativa
(Viva! Viva! Viva!)
Gita
...Eu sou a vela que acende
Eu sou a luz que se apaga
Eu sou a beira do abismo
Eu sou o tudo e o nada
Por que você me pergunta?
Perguntas não vão lhe mostrar
Que eu sou feito da terra
Do fogo, da água e do ar...
Cowboy fora da lei
Papai não quero provar nada
Eu já servi à Pátria amada
E todo mundo cobra minha luz, minha luz
Oh, coitado, foi tão cedo
Deus me livre, eu tenho medo
Morrer dependurado numa cruz
Eu não sou besta pra tirar onda de herói
Sou vacinado, eu sou cowboy
Cowboy fora da lei
Durango Kid só existe no gibi
E quem quiser que fique aqui
E entrar pra história é com vocês
Fim da vida de Raul Seixas - Homem deixado a si mesmo
A morte de Raul Seixas foi fartamente noticiada no Brasil e gerou grande comoção. Quem o conheceu, viu com tristeza, a decadência, física, moral e espiritual de homem inteligente, talentoso, mas que desperdiçou tudo isso em busca do ouro de tolo que ele mesmo pregou em outra canção. Aquilo que parece ter valor, mas na verdade não tem. Como um castelo de areia sem base sólida que dissipa no ar.
Neste vídeo, é possível ver uma das últimas entrevistas do artista, com todo seu potencial intelectual sequelado pelos excessos:
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Música